“Ouvem-se sussurros de uma história. Fechamos os olhos, para a vermos melhor. É assim que
as histórias devem ser ouvidas, de olhos fechados, pintadas em aguarela na nossa imaginação.
“Era uma vez uma casa branca nas dunas…”
Devagarinho, as cores começam a juntar-se ao texto. A casa branca, o mar azul, a areia
molhada pela tempestade, o sol que brilha; a menina e o rapazito. As palavras fazem-nos sorrir,
mesmo sem querermos, mesmo sem notarmos, quase sem sabermos porquê. Esta é uma história de
amizade, de coragem e de saudade. E esta é a história da cor e da vida. Porque no fundo do mar
tudo é bonito e há florestas de algas. No fundo do mar há coisas que nós nem imaginamos. E por
isso fechamos os olhos com mais força, para vermos ainda melhor. Na aguarela, formam-se os
desenhos que vemos aparecer na nossa cabeça. Ali, na tela branca, surgem os primeiros traços da
história que ouvimos em pequeninos. Ali, no vazio, surgem as primeiras imagens do que nos
contam ser o fundo do mar, de como é feita a casa da menina, das coisas bonitas e alegres que
existem lá no profundo desconhecido. Ali, misturam-se em movimento a Terra e o Mar, como se os
dois mundos vivessem num só quadro, naquele exacto momento em que as ondas largam na costa
toda a essência do oceano. Como é que explicamos, numa imagem, o entusiasmo desta viagem?
Como é que, num só plano, juntamos tantas dimensões? Assim: quando a nossa terra é o mar, as
lendas ganham vida, as amizades têm escamas, as camas fazem-se de algas e os polvos tocam
tambor. As meninas cabem na palma da nossa mão, mas têm a alma gigante. Nós sustemos a
respiração e pomos barbatanas nos pés. E se a isto juntarmos a arte, conquistamos o nosso lugar no
imaginário, tal qual esta aguarela. “A tua terra agora é o mar”, com o seu movimento e a
simplicidade do seu reboliço, junta o que de melhor nos traz a Menina do Mar: a beleza, a
criatividade, a perfeita união dos mundos e tantas histórias estampadas.
Ah, que sorte a tua, rapaz, que agora podes viver nesse mundo que nós só conseguimos
imaginar. Mas que sorte a nossa, também, que crescemos numa Terra onde existiu Sophia, que nos
entregou a chave para um lugar de fantasia. E que sorte a nossa, ainda, que artistas como Susana
Bravo transmitam com tanta vida, e com tanta energia, numa só pintura, toda a magia que sentimos
ao ouvir aqueles contos de criança.”
Ana Portocarrero